Não é de hoje que vivemos mergulhados em dúvidas e incertezas. A injustiça, o preconceito, a inveja, o julgamento errôneo, ... não são prerrogativas deste milênio. Bem antes de Cristo (exemplo de julgamento histórico e injusto), o homem já dispunha a pensar a possibilidade do julgamento ao proóximo, já havia a chama do fervor à justiça e ao suposto poder de condenar um semelhante.
Um exemplo disto é Sócrates, filho de um escultor e de uma parteira, e um dos maiores filósofos que a história tem conhecimento.
Apesar de não ter deixado nada escrito, Sócrates deixou marcas de texto e textura em seus discípulos (Xenofonte, Platão) e adversários (Aristófanes, por exemplo), que o imortalizaram.
O método filosófico de Sócrates era de uma coerência e artimanha que enredam o ouvinte. Consistia em usar, de maneira estratégica, dois recursos complementares: a Ironia e a Maiêutica (arte de extrair do interlocutor, por meio de perguntas, as verdades do objeto em questão). Num primeiro momento, interrogava seus interlocutores sobre o que estes pensavam saber, daí atacava de maneira lúcida (e, geralmente brilhante) suas respostas, até destronar seus "conceitos" e, é claro, a empáfia de sua arrogância. Costumava ser uma luta injusta, em que as "reflexões" eram sutilmente desmascaradas como idéias sem substâncias.
Derrotados em seu orgulho de saber, era hora de Sócrates dar o segunso passo: reconstruir. Uma nova série de questionamentos ajudava os discípulos a tocar o âmago de suas idéias, concebendo conceitos mais profundos e universais. Como sua mãe, Sócrates habilmente ajudava a filosofia a nascer daquelas consciências.
Sua profunda concepção de liberdade e pensamento o fazia questionar tudo, e não apenas isso, ensinar outros a questionar também.
Há 399 a.C., Sócrates, diante do tribunal popular, é acusado pelo poeta Meleto, pelo rico curtidor de peles Ânito (influente orador e político, também), e por Lícon, personagem de pouca importância.
A acusação era grave: ateísmo (recusava-se a cultuar devidamente os deuses do Estado), introdutor de novas divindades e subversão ao filosofar em público, orientando os jovens, e desta forma interpretado como corruptor da juventude.
Platão descreve a defesa de Sócrates:
Primeiramente, Sócrates examina e refuta as acusações que pairam sobre ele, retratando sua própria vida, procurando mostrar o verdadeiro significado de sua "missão". Dirige aos homens palavras que contestam o enriquecimento sem virtude, afirmando que a riqueza deverá vir através da virtude.
Em sua defesa, Sócrates, que atesta veementemente sua franqueza, busca um elemento que possa convencer os juízes de sua sabedoria. Menciona que o Oráculo de Delfos afirmou ser ele o homem mais sábio de sua época, pois ao inquirir os políticos, os poetas e os artíficies, todos afirmavam obter a plena sabedoria, e que somente ele, Sócrates, era o verdadeiro sábio porque tinha a plena noção de sua ignorância: "Sei que nada sei".
Em outro momento, Sócrates dialoga com um de seus acusadores, deixando-o bem embaraçado quanto ao significado da acusação "corromper a juventude". Demonstra que está sendo acusado por Meleto de algo que este mesmo não sabe ao certo o que significa.
Em nenhum momento de sua defesa, segundo o relato de Platão, Sócrates apela para a bajulação ou tenta captar a misericórdia daqueles que o julgavam, usando a linguagem de quem fala em nome da própria consciência e não reconhece, em si mesmo, nenhuma culpa.
"Pareceu-me não ser justo rogar ao juiz e fazer-me absolver por meio de súplicas; é preciso esclarecê-lo e convencê-lo".
Talvez, justamente por essas manifestações de independência de espírito, Sócrates foi condenado.
"Ora, o homem (Meleto) propõe a sentença de morte... Que sentença corporal ou pecuniária mereço, eu que entendi de não levar uma vida quieta? Eu que negligenciei riquezas, negócios, postos militares, tribunas e funções públicas, conchavos e lutas que ocorrem na política..."
Após o veredito, Sócrates dirige palavras aos que o condenaram:
"Não foi por falta de discursos que fui condenado, mas por falta de audácia e porque não quis que ouvísseis o que para vós teria sido mais agradável, coisas que considero indignas de mim, coisas que estás habituado a escutar de outros acusados".
Nesta altura, o filósofo começa a fazer comparações com a morte:
"Mais difícil que evitar a morte, é evitar o mal".
"... A morte pode ser uma dessas duas coisas: ou é uma destruição absoluta, ou é passagem da alma para outro lugar. Se tudo tem de extinguir-se, a morte será como uma dessas raras noites que passamos sem sonhos e sem nenhuma consciência de nós mesmos. Todavia, se a morte é apenas uma mudança de morada, a passagem para o outro lugar onde os mortos se têm de reunir, que felicidade a de encontrarmos lá aqueles a quem conhecemos! O meu maior prazer seria examinar de perto os habitantes dessa outra morada e de distinguir lá, como aqui, os que são dignos dos que se julgam tais e não o são".
"Mais eis a hora de partimos, eu para a morte, vós para a vida. Quem de nós segue o melhor rumo, ninguém o sabe, exceto o Deus".
Fontes:
Wikipédia
Webartigos.com
Rodrigues, Antônio Fernandes - Pérolas Literárias - pág.108 - Petit Editora e Distribuidora Ltda - 1997.
Um comentário:
Oi Suzan, bem articulada essa tua postagem. Ela contribui para conhecermos um pouco mais sobre filosofia e a contribuição de Sócrates. Pensando na prática educativa, o que consideras que essas leituras te auxiliam? Abração, Sibicca.
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